Guilherme Cortez relata como é ser um parlamentar jovem e LGBT
Deputado Guilherme Cortez (PSOL) fala sobre as dificuldades de ser um parlamente jovem e LGBT na Assembleia Legislativa de São Paulo.
1 jul 2024, 15:34 Tempo de leitura: 5 minutos, 4 segundosPublicado anteriormente em Terra
Um dos deputados mais jovens deste mandato na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), Guilherme Cortez (Psol) cotidianamente vence, como o próprio afirma, o etarismo e a LGBTfobia para desempenhar a sua função no legislativo paulista. Bissexual com orgulho, o parlamentar, que já elaborou mais de 20 projetos voltados à comunidade sexodiversa, afirma que pela sua perseverança vem conquistando o respeito de seus pares, mesmo alguns ainda o considerando uma “bicha chiliquenta”.
“Incomodo porque não correspondo a esse ideal de masculinidade que você tem nos espaços. Embora não seja o único parlamentar, mas quando alguém vai se referir à comunidade LGBTQIA+ de forma pejorativa, se refere a mim”, diz.
Além da diversidade sexual, meio ambiente também é uma prioridade na pauta política do parlamentar, que se auto intitula “viado verde”, em referência à candidatura de Herbert Daniel em 1988. Segundo ele, a defesa da pauta ambiental deve ser uma prioridade no movimento LGBTQIA+ e em outros movimentos sociais.
Cortez justifica seu posicionamento: “De nada adianta nossas lutas, se não tivermos um mundo para habitarmos”.
“Não tem como só defender as pautas LGBTs, porque não tem como você isolar quimicamente, como se fosse um cálculo estequiométrico, e falar: ‘Essa aqui é a pauta LGBTQIA+ pura’. As pautas da população LGBTQIA+ são também de segurança pública, educação, saúde pública…”, afirma.
Na conversa exclusiva para o Terra, ele ainda fala sobre sua pré-candidatura a prefeito de Franca, município do interior de São Paulo, o combate ao conservadorismo que “retarda o avanço das pautas LGBTs” e a agressão que sofreu por homofobia quando universitário.
Desde criança, gosto muito de política institucional. Minha entrada na política, por coincidência, ocorreu no mesmo período de descoberta da minha sexualidade. Por volta dos 15 anos, passei a me entender como um homem bissexual, e, na mesma época, comecei a me envolver também com o movimento estudantil. Então, a minha militância política sempre esteve muito ligada às pautas da comunidade LGBTQIA+.
Naquela época, somente havia uma representação LGBTQIA+ na política institucional, o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ). A representatividade dele foi muito importante para mim, porque podia me imaginar ocupando espaços na política institucional. Como ele, sou LGBTQIA+ e gosto de política.
O tempo passou, fui fazer faculdade no interior de São Paulo e continuei me envolvendo muito com política e me filiei ao Psol. Escolhi esta sigla porque, desde aquela época, a pauta LGBTQIA+ é tratada com muita centralidade e compromisso, mesmo quando o governo Dilma dava umas vaciladas e negociava o tema para atrair alguns apoios.
Em 2020, eu e mais um grupo de pessoas chegamos à conclusão que precisávamos ocupar um espaço político. Então, fui candidato a vereador em Franca, que é uma cidade conservadora, com muitos casos de violência. Eu próprio já fui vítima de violência física por conta da minha sexualidade.
Neste pleito, tivemos um grato resultado, fui o quarto candidato mais votado da cidade, mesmo levando a bandeira LGBTQIA+, que muita gente dizia que não teria viabilidade eleitoral. Por causa do quociente eleitoral, não tive votos suficientes para ocupar um mandato.
Já na eleição seguinte, vi a necessidade de continuar utilizando essa audiência que eu tinha conquistado e tivemos um resultado muito surpreendente para todo mundo, pois fui eleito. Digo que não tem precedentes na minha situação, pois sou um dos deputados mais jovens da Alesp [Assembleia Legislativa de São Paulo], um dos poucos LGBTs, de uma região que nunca tinha eleito ninguém de esquerda, e com a campanha mais barata do Estado. Então, se você examinar friamente, ninguém diria que a gente tinha chance de se eleger, porque não tinha nenhum caso que se assemelhasse.
A Alesp está preparada para receber homens que questionam os estereótipos de masculinidade? Já sofreu algum preconceito explícito no exercício do seu mandato?
É uma quebra de paradigmas todos os dias. A Alesp é majoritariamente conservadora, com muita oposição às pautas da comunidade LGBTQIA+. Quando você é uma pessoa LGBTQIA+ dentro desse espaço, você é o alvo de todo esse combate à diversidade. Hoje, nós temos sete mandatos, inclusive dois coletivos com composição de pessoas LGBTs. Neste grupo, sou o único homem. Em mim cai a pecha da bicha afetada e chiliquenta. Como sou muito jovem, quando os deputados querem me atacar, eles não rebatem as minhas ideias, mas me atacam pela idade. “Você é um jovem LGBT que é muito impetuoso”, diz um. “Você é escandaloso”, diz outro.
Incomodo porque não correspondo a esse ideal de masculinidade que você tem nos espaços. Embora não seja o único parlamentar, quando alguém vai se referir à comunidade LGBTQIA+ de forma pejorativa, se refere a mim.
Todos os dias, sinto que não estou lá me representando, mas representando toda uma comunidade. Então, quando uma pessoa me ofende ou ofende a nossa comunidade é meu dever contrapor. Caso contrário, estamos abrindo um precedente para esse discurso de ódio. Preciso mostrar que a política institucional também é espaço para as pessoas LGBTQIA+, e para as pessoas jovens. Ser desse jeito não torna a minha atuação pior, pelo contrário.
Tenho 26 anos, sou bissexual, e falo abertamente da minha sexualidade. Isso não me torna uma pessoa menos competente e séria, pelo contrário. Isso me permite refletir a realidade de uma população que, na maior parte das vezes, o Legislativo se fecha ao ouvir.
Não teve nada explícito até agora, mas eu sinto pelos olhares e provocações. Eles querem que você caia numa pilha, fazem de tudo para te tirar do sério e aí poderem falar: ‘Deixei a bixa louca’ ou ‘Fiz ele sair do sério’. Eles procuram essa reação, para depois me desmoralizar.